Em um país,
no qual, a pobreza sempre foi um dos maiores expoentes de reconhecimento
mundial, a prática de esportes não poderia deixar de ser uma premissa da
burguesia local, principalmente no engatinhar de uma nação que ainda está longe
de chegar à inquietação própria da adolescência.
Quando o
futebol chegou ao Brasil, era dado às famílias tradicionais a prática de um
esporte, que mais tarde daria demonstrações que a ginga não é herdada, também
não é ensinada, nasce e aperfeiçoa-se com a malandragem reinante em quem
aprendeu a driblar as dificuldades da vida.
Nesse
contexto, não é de causar estranheza que a camada da sociedade que vive à
margem da linha da pobreza, é quem mais contribui para a perpetuação do
esporte. E no Brasil, assim como no resto do Mundo, os negros continuam sendo
as maiores estrelas desse esporte que encanta multidões e é responsável por
assombros indignos e revoltantes como a questão brutal e sepulcral, que é o
racismo étnico-racial.
Na semana
passada, durante jogo válido pela Taça Bridgestone Libertadores, na cidade de
Huancayo, no Peru, entre Cruzeiro e Real Garcilaso, o volante Tinga foi
desrespeitado em sua essência, pela acéfala torcida local que imitava sons
característicos dos primatas toda vez que ele tocava na bola.
As nossas
percepções despidas de conhecimento sobre determinado tema, remete-nos ao que
chamamos de “preconceito”, ou “conceito pré-estabelecido”, sobre aquilo que não
conhecemos com o mínimo de exatidão. Entretanto, com relação à questão
étnico-racial, pode-se facilmente definir como intolerância, ou até mesmo como
ignorância em alto grau de destruição. O futebol mais uma vez foi envergonhado
pela ignorância de fascistas travestidos de torcedores.
Nas andanças
da vida, os ensinamentos e as percepções de mundo foram as molas catalisadoras
para a construção ética de homens que lutaram pelos seus ideais. Durante toda a
“peregrinação” desses desbravadores, a sensibilidade sempre foi o divisor de
águas para poder mantê-los firmes nos preceitos constituídos dentro dos seus
princípios básicos de solidariedade e amor ao próximo.
Não se pode
falar de preconceito racial sem remeter as nossas lembranças a Nelson Mandela, que
teve em sua vida as marcas profundas da intolerância racial e por longos 27
anos, foi prisioneiro das arbitrariedades dos que governaram a África do Sul
após a Guerra dos Boeres (1902). Foi nesse período que teve início a maior
política de segregação racial que o mundo testemunhou. Os governantes da época
achavam que através dessa iniciativa poderiam manter o domínio sobre a
população nativa. Esse regime de segregação racial, ficou conhecido como
apartheid.
Apenas a
partir de 1989, após a ascensão de Frederick de Klerk ao poder, a elite branca
começa as negociações que determinariam a legalização do CNA e de todos os
grupos contrários ao apartheid e a libertação de Mandela.
Em 11 de
fevereiro de 1990 Mandela finalmente é solto. Aclamado por uma multidão, o
líder africano responde erguendo o punho fechado. Em suas declarações, Mandela
afirma: “quando me vi no meio da multidão, alcei o punho direito e estalou um
clamor. Não havia podido fazer isso desde há vinte e sete anos, e me invadiu
uma sensação de alegria e de força”.
Nelson
Mandela era o maior líder que a África do Sul tinha, e também foi o mais
emblemático opositor ao Apartheid. Algum tempo depois ele seria eleito o
primeiro presidente negro do país, e também caberia a ele a responsabilidade
pela política de reaproximação entre brancos e negros.
No final do
ano passado, mais precisamente no dia 5 de dezembro de 2013, o presidente
sul-africano Jacob Zuma anunciou a morte do seu antecessor: "A nação perde
seu maior líder". Em discurso o atual presidente afirmou: "ainda que
soubéssemos que esse dia iria chegar, nada pode diminuir nosso sentimento de
perda profunda".
É bom
lembrar, que não estamos comparando Tinga a Nelson Mandela, muito pelo
contrário. Entretanto, ambos conseguiram unir lados opostos contra o
preconceito étnico-racial. Tinga, dentro das suas possibilidades, uniu
torcedores do Atlético Mineiro e Cruzeiro, eternos rivais, em um grande e
eloquente discurso contra a intolerância racial.
O Brasil
também indignou-se com todo o lamentável episódio, e como toda essa grande
epopeia não fosse o bastante para tratar sobre a questão do racismo, eis que
fora de campo o preconceito apronta novamente com as suas vítimas, e uma
australiana, no auge da sua puritanidade étnica, vivendo longe dos seus
domínios acha-se melhor que uma brasileira, negra e com muito orgulho por ser descendente
do povo que realmente foi responsável pela edificação do Brasil. Em poucas
palavras, a australiana deveria estar em qualquer outro lugar, menos aqui no
Brasil, um país com maioria negra.
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