quarta-feira, 12 de março de 2014

A ignorância explicita do racismo




 Em um país, no qual, a pobreza sempre foi um dos maiores expoentes de reconhecimento mundial, a prática de esportes não poderia deixar de ser uma premissa da burguesia local, principalmente no engatinhar de uma nação que ainda está longe de chegar à inquietação própria da adolescência.
Quando o futebol chegou ao Brasil, era dado às famílias tradicionais a prática de um esporte, que mais tarde daria demonstrações que a ginga não é herdada, também não é ensinada, nasce e aperfeiçoa-se com a malandragem reinante em quem aprendeu a driblar as dificuldades da vida.
Nesse contexto, não é de causar estranheza que a camada da sociedade que vive à margem da linha da pobreza, é quem mais contribui para a perpetuação do esporte. E no Brasil, assim como no resto do Mundo, os negros continuam sendo as maiores estrelas desse esporte que encanta multidões e é responsável por assombros indignos e revoltantes como a questão brutal e sepulcral, que é o racismo étnico-racial.
Na semana passada, durante jogo válido pela Taça Bridgestone Libertadores, na cidade de Huancayo, no Peru, entre Cruzeiro e Real Garcilaso, o volante Tinga foi desrespeitado em sua essência, pela acéfala torcida local que imitava sons característicos dos primatas toda vez que ele tocava na bola.
As nossas percepções despidas de conhecimento sobre determinado tema, remete-nos ao que chamamos de “preconceito”, ou “conceito pré-estabelecido”, sobre aquilo que não conhecemos com o mínimo de exatidão. Entretanto, com relação à questão étnico-racial, pode-se facilmente definir como intolerância, ou até mesmo como ignorância em alto grau de destruição. O futebol mais uma vez foi envergonhado pela ignorância de fascistas travestidos de torcedores.
Nas andanças da vida, os ensinamentos e as percepções de mundo foram as molas catalisadoras para a construção ética de homens que lutaram pelos seus ideais. Durante toda a “peregrinação” desses desbravadores, a sensibilidade sempre foi o divisor de águas para poder mantê-los firmes nos preceitos constituídos dentro dos seus princípios básicos de solidariedade e amor ao próximo.
Não se pode falar de preconceito racial sem remeter as nossas lembranças a Nelson Mandela, que teve em sua vida as marcas profundas da intolerância racial e por longos 27 anos, foi prisioneiro das arbitrariedades dos que governaram a África do Sul após a Guerra dos Boeres (1902). Foi nesse período que teve início a maior política de segregação racial que o mundo testemunhou. Os governantes da época achavam que através dessa iniciativa poderiam manter o domínio sobre a população nativa. Esse regime de segregação racial, ficou conhecido como apartheid.
Apenas a partir de 1989, após a ascensão de Frederick de Klerk ao poder, a elite branca começa as negociações que determinariam a legalização do CNA e de todos os grupos contrários ao apartheid e a libertação de Mandela.
Em 11 de fevereiro de 1990 Mandela finalmente é solto. Aclamado por uma multidão, o líder africano responde erguendo o punho fechado. Em suas declarações, Mandela afirma: “quando me vi no meio da multidão, alcei o punho direito e estalou um clamor. Não havia podido fazer isso desde há vinte e sete anos, e me invadiu uma sensação de alegria e de força”.
Nelson Mandela era o maior líder que a África do Sul tinha, e também foi o mais emblemático opositor ao Apartheid. Algum tempo depois ele seria eleito o primeiro presidente negro do país, e também caberia a ele a responsabilidade pela política de reaproximação entre brancos e negros.
No final do ano passado, mais precisamente no dia 5 de dezembro de 2013, o presidente sul-africano Jacob Zuma anunciou a morte do seu antecessor: "A nação perde seu maior líder". Em discurso o atual presidente afirmou: "ainda que soubéssemos que esse dia iria chegar, nada pode diminuir nosso sentimento de perda profunda".
É bom lembrar, que não estamos comparando Tinga a Nelson Mandela, muito pelo contrário. Entretanto, ambos conseguiram unir lados opostos contra o preconceito étnico-racial. Tinga, dentro das suas possibilidades, uniu torcedores do Atlético Mineiro e Cruzeiro, eternos rivais, em um grande e eloquente discurso contra a intolerância racial.
O Brasil também indignou-se com todo o lamentável episódio, e como toda essa grande epopeia não fosse o bastante para tratar sobre a questão do racismo, eis que fora de campo o preconceito apronta novamente com as suas vítimas, e uma australiana, no auge da sua puritanidade étnica, vivendo longe dos seus domínios acha-se melhor que uma brasileira, negra e com muito orgulho por ser descendente do povo que realmente foi responsável pela edificação do Brasil. Em poucas palavras, a australiana deveria estar em qualquer outro lugar, menos aqui no Brasil, um país com maioria negra.

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